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terça-feira, 6 de junho de 2023

CARTA QUE RECEBI


No momento em que várias pessoas já se manifestaram no Face contra a desapropriação do DA/UNIFEI, quero fazer coro com Edson Riera, publicando os dois textos abaixo, que estrariam complementando informações sobre fatos e pessoas nos idos de 1968: O Ano que não terminou, segundo obra de Zuenir Ventura.

I.P.M. (Inquérito Policial Militar) - Sérgio Roberto Costa

Depois do Trigésimo Congresso da UNE em Ibiúna, os estudantes voltaram à rotina das universidades: aulas, trabalhos escolares, reuniões e assembleias político-reivindicatórias, com propostas, principalmente, de greves ou passeatas, pois a luta contra a ditadura militar continuava e eles sabiam das consequências que poderiam advir. Sabiam que a qualquer momento poderiam ser intimados a responder a um IPM, principalmente os que moravam onde havia alguma unidade militar, como era o meu caso. Em Itajubá está sediado o 4º. Batalhão de Engenharia e Combate, alcunhado de “Os pontoneiros da Mantiqueira”. Um coronel sempre está no comando da unidade. Na época, era comandante o Coronel Miranda, que tinha um marmelal na antiga Queimada, hoje Marmelópolis. Além de dono de marmelal, também fazia parte do grupo que administrava a Cooperativa de fruticultores do distrito de Queimada. Meu pai, Roberto Costa, antigo comerciante do lugar, era amigo e conhecido do coronel que me conheceu na fábrica Cooperativa, como era chamada. Meu tio Ivo, formado em contabilidade, era assessor do coronel na Cooperativa. Era fevereiro de 1968, e acontecia a safra do marmelo. Fui passear lá quando meu tio me apresentou ao coronel, que depois me elogiara a meu tio:
– Esse filho do Roberto é muito inteligente, né Ivo!
Em outubro de 1968, houve o 30º. Congresso da UNE, quando fui preso com quase mil estudantes de todos os estados do Brasil, em Ibiúna/SP. Fui fichado e dispensado por não ter implicações políticas anteriores, segundo os militares. Mas não escapei do IPM no 4º. Batalhão de Itajubá. Recebi intimação, assim como Jaime Petit do DA do Instituto Eletrotécnico de Itajubá, Alceu do DA da Faculdade de Economia, Edson do DA do INATEL de Santa Rita do Sapucaí e mais umas quatro pessoas, também consideradas subversivas pelos militares. “Subversivo” era o epíteto dado a qualquer pessoa que se colocava contra o regime militar. Jaime Petit foi o único a não comparecer, pois havia fugido e estava no Pará participando da Guerrilha do Araguaia, como ficamos sabendo depois de longos anos (V. texto abaixo).
Conduzidos por dois sargentos, fomos levados à sala do coronel Miranda, uma sala ampla e com várias cadeiras à frente da escrivaninha onde ele se achava. Várias fichas sobre sua mesa. Ele não se levantou quando entramos. Imponente e ditatorial atrás da escrivaninha. Ia lendo o nome constante de cada ficha e perguntava quem era. Quando leu meu nome e me encarou, fez de conta que não me conheceu:
– Quem é Sérgio Roberto Costa?
Depois dessa intimação e reunião com o coronel, tivemos que voltar várias vezes ao Batalhão para responder aos Inquéritos e ouvir as ameaças de prisão, caso nos envolvêssemos em manifestações públicas contra o Regime Militar. Mesmo que as manifestações fossem apenas com palavras em salas de aulas de faculdade...
– Tomem cuidado com reuniões subversivas! Ameaçou.

FUGA - Sérgio Roberto Costa

Jaime Petit se recusara a responder ao I.P.M., mas não contou a ninguém por quê. Pediu uma reunião com os colegas que estiveram no Trigésimo Congresso da UNE em Ibiúna. Maria Auxiliadora Costa, nossa colega do DAFAFI, me procurou em nome dele e chamamos todos os colegas. Minha República, perto do Mercado Municipal, foi o lugar mais discreto para nos reunirmos. Disfarçadamente, cada um foi chegando, no final da tarde, quando o movimento de pessoas voltando para casa era mais intenso. Jaime chegou com a esposa Regilena e, tranquilo e sério como sempre, foi direto ao assunto, pois já estava tudo preparado para a fuga de Itajubá. Nenhum argumento que usamos tentando convencê-lo a ficar funcionou. Estava no quinto ano de engenharia no antigo IEI, hoje UINFEI, e iria se formar no final do ano. Faltava praticamente um mês. Nada o demoveu da decisão tomada. Bastaria ir ao Batalhão responder ao I.P.M., formar-se e continuar a luta contra a Ditadura. Mas não. Estava tudo planejado em família. Lúcio, há dois anos formado no IEI, trabalhava como engenheiro em Campinas, abandonaria o emprego. Lúcia deixaria o último ano do ensino médio em São Paulo. Jaime e Regilena se encontrariam com Lúcio e Lúcia e iriam se integrar à guerrilha do Araguaia no Bico do Papagaio, no sul do Pará. Só ficamos sabendo disso tudo, bem mais tarde, quando a notícia do desbaratamento da guerrilha do Araguaia pelo Exército Brasileiro chegou aos jornais e a lista dos mortos foi publicada na imprensa. Regilena escapara e ficou presa em Brasília até a anistia, quando voltou para Itajubá e trabalhou no jornal O Sul de Minas. Há tempo faleceu!

Blog: Tenho admiração por aqueles que lutaram pelo que acreditavam. O Prof. Sérgio tem a minha admiração. 

Viver é Perigoso

2 comentários:

Anônimo disse...

Importante lutar!
👍👏👏🇧🇷

Aldo disse...

Pois é. E comentando com o Sérgio, meu professor no João XXIII sobre a situação, eu como soldado, fui denunciado e detido no batalhão local. O mesmo coronel me colocou em frente ao batalhão e me colocou abaixo de zero, tentando me humilhar.E começou a prsssão psicológica que, felizmente, não em afetou em nada.Alduns dias depois fui liberado pelo capitão Fagundes, s/2, para fazer vestibular. Passei e fui o primeiro soldado a passar no vestibular segundo eles, e o coronel ou major, não me lembro, me colocou novamente na frente do batalhão e me elogiou (???). Gostei muito da época militar por alguns ângulos. Por outros, pelo amor de Deus! Hoje então, com as traIções de Brasilia, me envergonho de ter sido oficial, em outro pedido em que servi ao exercito ( servi por 2 vezes 0