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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

COMO SER UM CORRUPTO HONESTO

Dorrit Harazim escreveu (O Globo): 

O americano George Plunkitt (1842-1924) foi deputado e senador estadual de Nova York por mais de quatro décadas, entre o final do século XIX e início do XX.
De origem irlandesa, o exuberante Plunkitt começou a vida como ajudante de açougueiro e morreu como um dos homens mais ricos de Nova York.
Seu legado para a humanidade é um livrinho fino de filosofia política intitulado “Tammany Hall: A Series of Very Plain Talks on Very Practical Politics” (em tradução livre, “Uma Série de Conversas Francas sobre o lado Muito Prático da Política”).
Sua publicação acaba de completar 100 anos e tornou-se um clássico da literatura americana.
É fácil entender por que o título nunca saiu de catálogo: suas 64 páginas falam uma linguagem universal, degustável em qualquer canto do mundo.
Alguns tópicos essenciais dos fundamentos de Plunkitt:

A vida feita de oportunidades

“Todo mundo anda dizendo que estamos enriquecendo através de suborno e corrupção, mas ninguém parou para fazer uma distinção entre ilícito honesto e ilícito desonesto. Existe uma diferença enorme entre os dois. Não nego que muitos de nós enriqueceram na política. Inclusive eu. Fiz fortuna com ela e a cada dia fico mais rico. Mas nunca me envolvi com roubalheiras desonestas, como chantagem, jogatina, rede de prostituição, etc. Sou um exemplo de como o ilícito honesto funciona e posso resumir a prática numa única frase: ‘Aproveitei as oportunidades que apareceram.’
Vou dar dois exemplos:
Meu partido pretende realizar melhorias na infraestrutura da cidade. Alguém me passa a dica de que há planos para um novo parque em determinada região. Vejo nisso uma oportunidade e trato de comprar o maior número possível de terrenos vizinhos. Assim, quando o departamento disso ou daquilo tornar público o projeto, haverá uma corrida para a compra dos terrenos que até então interessavam pouco. Não é perfeitamente honesto eu cobrar alto e lucrar o máximo com o investimento e a aposta que fiz? Claro que é.
Ou então vamos supor que a prefeitura tenha planos de construir uma nova ponte e eu receba essa informação de cocheira. Trato de comprar as propriedades que serão vitais para fazer os acessos à ponte e as revendo por um preço maior. Mais dinheiro vai pingar na minha conta bancária. Quem não faria a mesma coisa? No fundo, não é diferente de investir em Wall Street ou no mercado do café ou algodão. São negócios honestos e fico à espreita deles todos os dias do ano.
Quero acrescentar que a maioria dos políticos acusados de roubar os cofres públicos enriqueceu da mesma forma. Eles não roubaram um único centavo de dinheiro público, apenas souberam aproveitar as oportunidades. É por isso que quando um novo governo reformista toma posse e gasta meio milhão de dólares tentando descobrir as falcatruas que denunciou durante a campanha eleitoral nada encontra.”

Caridade 

“Quando um incêndio destrói a casa de uma família, não pergunto se ela é democrata ou republicana, e não a encaminho a alguma entidade beneficente, pois essa vai primeiro investigar o caso durante um ou dois meses para só então decidir se a família deve ser ajudada. A essa hora todos já morreram de fome. Eu, não: vou logo distribuindo alguns trocados, compro roupas caso eles tenham tido tudo queimado e dou a mão até eles poderem ficar de pé sozinhos. Isso é filantropia, mas também é política — e política com “p” maiúsculo. Quem pode prever quantos votos esses incêndios me trarão? Os pobres têm mais amigos entre si do que os ricos.”

Loteamento de cargos

“Não há em Nova York quem tenha faro mais aguçado para cargos públicos do que eu. Já ao acordar farejo se um cargo ficou disponível na noite anterior, e em qual secretaria. Sou sempre o primeiro a me apresentar. Ainda na semana passada apareci às 9h da manhã no Departamento de Águas e disse que queria a vaga para um dos meus eleitores. ‘Mas como o senhor soube que [o funcionário O’Brien] saiu?’, quis saber o servidor. ‘Senti algo no ar, ao acordar’, respondi. A verdade é que eu não tinha a menor ideia de que havia um funcionário chamado O’Brien no departamento, nem que ele tivesse ido embora, apenas farejei algo que me fez ir ao Depto. de Águas, e meu faro quase nunca me engana.”

Em determinada época de sua carreira, Plunkitt chegou a ocupar quatro cargos públicos simultaneamente, recebendo salário em três deles.
Neste quesito os brasileiros o ultrapassam, por meios mais tortuosos. Mas em matéria de suar a camisa, Plunkitt é um exemplo que poucos corruptos nacionais têm intenção de copiar. Consta que num único dia de sua agenda política ele atendeu pessoalmente a sete compromissos: ajudou as vítimas de um incêndio; 2) obteve o relaxamento da prisão de seis bêbados defendendo-os perante o juiz; 3) pagou o aluguel de uma família de imigrantes irlandeses para evitar que ficassem sem teto; 4) empregou quatro eleitores; 5) foi ao enterro de outros dois, um italiano e um judeu; 6) foi a um Bar Mitzvah; 7) foi a um casamento.
Ser corrupto honesto dava trabalho na Nova York da virada do século XIX. No Brasil do século XXI, nem isso.

Dorrit Harazim

Um comentário:

Anônimo disse...

Leia hoje o Itajuba Noticias e veja só como a maracutaia corre solta na Cidade.
Não é brinquedo não!
TEM LADRÃO NO PEDAÇO!