DE FRENTE PARA TRÁS

A reunião do secretariado da pequena cidade do interior seguia muito animada, ainda que só com manifestações do prefeito. Todos aguardavam as sua sábias palavras para levantar o braço e emitir sua concordância e seu total e irrestrito apoio e solidariedade.

Não poucas vezes, todos se levantavam e aplaudiam entusiasticamente as ideias do alcaide.

Numa dessas, uma secretária se entusiasmou além do previsto e começou a entoar o "parabéns prá você". Um colega de secretariado, mais lúcido, poupou-a do vexame, dando-lhe um toquinho com o cotovelo.

Chegaram no ponto crítico:

Como solucionar o problema do "pessoal de rua" que estava utilizando as proximidades da estação rodoviária como dormitório e mesmo como residência fixa ?

Silêncio geral.

Foi quando um hoje ex-secretário, brilhantemente sugeriu:

- Vamos reconstruir o museu e cercar o local, expulsando desta forma os seus moradores. A Caixa Econômica tem recursos para isso.

- Todos os olhares se voltaram para o alcaide, aguardando o seu parecer.

 Depois de raciocinar rapidamente por uns trinta minutos, o chefe sorriu e proferiu uma de suas raras frases de apoio: Boa ideia, siga em frente.

Aplausos gerais (não para a ideia, mas para a concordância com a ideia).

Feito novamente o silêncio, uma audaciosa ex-secretária, levantou-se e proferiu o seu último questionamento no cargo antes de ser devida e caprichosamente fritada e banida:

- Tudo bem, resolveremos o problemas social, mas o que colocaremos em exposição no museu ?

Olhares atônitos se intercalaram entre o chefe e a moça questionadora. 

Dando um murro na mesa, berrou o alcaide:

- Isso não é problema de sua alçada. Atenha-se a ciência e tecnologia, que é a sua área. E prosseguindo:

- Acervo para o museu não  constitui problema. A medida que o tempo vai passando, os objetos vão ficando velhos e iremos levando para o museu.

E concluindo magistralmente: - Enviarei um projeto de lei para a câmara, decretando que a partir de hoje, tudo com mais de 50 anos de idade seja considerado velho e histórico e desta forma, digno e cabível de ser exposto no nosso museu.

E levantando-se encerrou a sessão, não sem ouvir a intervenção do seu secretário de governo:

- PQP vá ser sábio assim lá nos Açores.

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