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sábado, 19 de fevereiro de 2011

O ÚLTIMO DESEJO

Ontem presenciei a cena. Assisti com toda a atenção e disponibidade de tempo possível. E mais, com fundo musical.
Foi no bom, Pizza e Cia.
Antes de contar o lance, é bom registrar que todos nós já passamos por isso.
Estou me referindo ao objeto de desejo, no qual se transforma a última batatinha, ou o último filezinho que fica na travessa de inox sobre a mesa.
Eram em seis os jovens, entre  meninas e meninos. Todos com cara de muita fome e não muita grana.
Tomaram as suas cocas, suas cervejas e o filezinho sobrevivente, tal qual o último dos moicanos, permanecia solitário.
A conversa rolava meio sem nexo e com toda a indiferença de um tigre de bengala pronto para desfechar o ataque a uma distraída presa, todos mantinham o rabo (tem rabo ?) dos olhos na bem passada lasquinha de contra-filet.
Para enfeitar e torná-la mais apetitosa, uma fatia de cebola frita lhe cobria meio corpo.
Uma mocinha que estava localizada numa posição geográfica mais desvantajosa, deu uma ajeitada sutil na sua cadeira, aproximando-se mais do namorado e consequentemente do petisco.
Do outro lado da mesa, o rapaz com penteado de chuquinha, empunhando um garfo, tal como o Gregory Peck no filme Moby Dick, preparou-se para a arpoagem.
Desconfiança geral na mesa. Ambiente ruim de cobiça.
Pergunto eu: o que faria tão desejado um derradeiro e encolhido filezinho ? 
O moço gordinho (e com espinhas), deu uma significativa lambida no beiço.
Eu estava apostando no cover do Newmar, que fingia estar mexendo no celular.
Foi quando aconteceu a tragédia ou o que evitou uma tragédia.
Como uma águia, num mergulho com extrema velocidade e precisão, um garçon, de passagem pela cena do crime, esticou o braço e colheu a tijelinha de inox contendo o último desejo da meninada.
Os olhares, com um misto de indignação e já de saudade, seguiram a bandeja até  a curva da cozinha.
Sorrisos amarelos tomaram conta da mesa.

ER

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bem escrito. Parabéns!