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sexta-feira, 13 de agosto de 2010

VELHOS HERÓIS DE GUERRA

RESSACA

(Luís Fernando Veríssimo) - 

Hoje existem pílulas milagrosas, mas ainda sou do tempo das grandes ressacas. As bebedeiras de antigamente eram mais dignas, porque você as tomava sabendo que no dia seguinte estaria no inferno. Além de saúde era preciso coragem. As nova gerações não conhecem ressaca, o que talvez explique a falência dos velhos valores. A ressaca era a prova de que a retribuição divina existe e que nenhum prazer ficará sem castigo.
Cada porre era um desafio ao céu e às suas feras. E elas vinham: náusea, azia, dor de cabeça, dúvidas existenciais - as golfadas.
Hoje, as bebedeiras não tem a mesma grandeza. São inconsequentes, literalmente. Não é que eu fosse um bêbado, mas me lembro de todos os sábados da minha adolescência como uma luta desigual entre a cuba-libre e o meu instinto de autopresservação. A cuba-libre ganhava sempre. Já dos domingos me lembro de muito pouco, salvo a tontura e o desejo de morte
Jurava que nunca mais ia beber, mas, antes dos trinta, "nunca mais" dura pouco. Ou então o próximo sábado custava tanto  a chegar que parecia mesmo uma eternidade.
Não sei o que a cuba-libre fez com o meu organismo, mas até hoje quando vejo uma garrafa de rum os dedos do meu pé se encolhem.
Hoje não existe mais isto. As pessoas bebem e não acontece nada. No dia seguinte estão saudáveis, bem-dispostas e fazem até piadas a respeito.
De vez em quando alguns dos nossos se encontram e se saúdam em silêncio. Somos como veteranos de velhas guerras lembrando os companheiros caídos e o nosso heroísmo anônimo.
Estivemos no inferno e voltamos inteiros.
Um brinde e um Engov.

(enviado pelo Walter Bianchi ) -  Veterano companheiro de batalhas do tipo.

ER

3 comentários:

Anônimo disse...

Walter,

Vc.descreveu muito bem como foi a minha juventude. Fiquei mais de 30 anos sem conseguir tomar uma caipirinha de cachaça. Outro dia me aventurei, mas ainda sinto as marcas de uma ressaca muito antiga. Outro caso é do gim. Resolvi testar se ainda continuava aquela ressaca, comprei uma garrafa do Beefeater e fiquei só no primeiro gole. Nada como um bom vinho com as pessoas mais chegadas.Invariavelmente, durante muitos anos, todas as sextas feiras em casa ou fora tomávamos 1 ou 2 garrafas de vinho. Hoje continuo gostando de vinho, mas sem o ritual das 6as. feiras.
Um abraço.
Humberto.

Anônimo disse...

Walter,
Desculpe, agora que eu prestei atenção que o texto foi escrito pelo Veríssimo. Continuam valendo os meus comentários.
Fica o agradecimento por vc. ter enviado para o blog.
Abçs.
Humberto.

JÚLIO ANSELMO disse...

Camarada,

(IN)Felizmente nunca tive e continuo não tendo este problema de ressaca, já tomei vinho, vodka, cerveja, cachaça e nada me proporciona esta sensação horrorosa no dia seguinte. Não posso desfrutar da alegria de saber como é bom passar mal e sonhar com o dia em que (ainda) vou parar de beber para não passar mais por isso. Que pena...

JCA