Do Hélio Schwartsman - Folha
Partes do cérebro sentem prazer quando recebemos elogios, mesmo se forem falsos
A cada instante nasce um otário - e nós já somamos quase 7 bilhões de pacóvios. Apesar da propaganda dos moralistas, mentir é um bom negócio e é por isso que golpes prosperam mundo afora.
O problema, como mostra o psicólogo especializado em mentiras Robert Feldman, é que o golpista já começa o jogo com enorme vantagem.
Nossos cérebros trazem uma série de vieses que operam em favor de esquemas como o da premiação. O mais simples é o viés de verdade.
O padrão é aceitar como verdadeiras todas as declarações que nos chegam à cachola. Na maioria das vezes, elas são mesmo (ou a linguagem não teria se desenvolvido), e o custo de duvidar de tudo seria demasiado alto.
Outro mecanismo valioso para vigaristas é o autoengano. Ele faz com que o cérebro, para pacificar contradições, reelabore a questão.
Quando venço no pôquer, convenço-me de que sou um jogador exímio; quando perco, tive azar. Construímos uma autoimagem positiva.
No fundo, todo mundo quer acreditar nos falsos cumprimentos que recebe.
Na verdade, partes mais primitivas do cérebro acreditam, e isso produz reações químicas que geram prazer. Até o mais desafinado se sente bem se elogiado por seu hipócrita professor de música.
Se o sujeito é um pouquinho mais vaidoso, como às vezes é o caso de médicos, envolvê-lo no jogo por um elogio é tão fácil como roubar doce de criança. Ainda que os centros do cérebro acionem o sinal de alarme, este será abafado pela lisonja.
Acrescente um cenário convincente e elasticidade nas fronteiras semânticas entre "comprar um prêmio" e "adquirir convites para o jantar" e o jogo está ganho.
Frequentemente, somos cúmplices voluntários da mentira que nos contam.
Hélio Schwartsman
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