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sexta-feira, 29 de março de 2019

O MONSTRO

A lei que instituiu o SNI (Serviço Nacional de Informações) foi assinada pelo primeiro presidente da ditadura, o general Castello Branco, em 13 de junho de 1964. O projeto foi enviado ao Congresso em maio e aprovado a jato.

OSNI estendeu seus braços de espionagem sobre 249 órgãos públicos diversos como ministérios, autarquias, fundações e estatais. No início dos anos 1980, seu próprio idealizador, o general Golbery do Couto e Silva, reconheceu que tinha "criado um monstro".

Na época, o deputado gaúcho, Mem de Sá, opositor ao projeto de criação do SNI, adiantou:

 "O SNI "poderá se transformar num instrumento, sem controle, de opressão e até de subversão, e um presidente que queira promover a subversão encontrará legalizado um instrumento ideal para o seu objetivo. O SNI estará isento de quaisquer prescrições que determinem a publicação ou divulgação de sua organização, funcionamentos e efetivos. O chefe do SNI, com status de ministro, a "promover a colaboração, gratuita ou gratificada, de civis ou militares, servidores públicos ou não, em condições de participar de atividades específicas", mediante "gratificação especial fixada anualmente pelo presidente da República".

Segundo o historiador e professor da UFRJ, Carlos Fico:

Ao longo de 26 anos, até ser extinto em 1990, o SNI criou imenso arquivo de informações.  Foram produzidos pelo menos 308 mil prontuários de pessoas e instituições, registrados em 220 mil microfichas e 74 caixas-arquivo. Esses números, porém, são apenas um pedaço da produção total do SNI. Foi o que escapou do processo de destruição desencadeado no final da ditadura - milhares de documentos foram incinerados nos anos anteriores à redemocratização, em 1985 - e restrito ao que estava arquivado no próprio SNI.

Cada órgão público vinculado à rede do SNI também mantinha seu próprio arquivo, alimentados por braços denominados DSI (Divisão de Segurança e Informações) e ASI (Assessoria de Segurança e Informação).Só o SNI chegou a ter 2.500 funcionários.

Frequentemente, os órgãos que integravam o Sisni ultrapassavam o levantamento das opções políticas das pessoas investigadas, registrando também dados —muitas vezes falsos— sobre a sexualidade, os relacionamentos e outros aspectos da vida privada dos brasileiros tidos como 'inimigos do regime'"

O historiador observou que todos os países, inclusive os democráticos, contam com órgãos de informação capazes de fornecer ao Executivo dados estratégicos para a tomada de decisões, mas durante a ditadura o Sisni "passou a espionar a vida dos cidadãos brasileiros, alimentando dossiês com informações que pudessem eventualmente inculpar os inimigos do regime".

As informações também serviam de base para as prisões efetuadas pelos órgãos da inteligência que formavam outro organismo, o Sissegin (Sistema de Segurança Interna do País), que coordenava centros de tortura como os DOI-Codi do Exército.

A tarefa de executar prisões, interrogatórios e tortura ficava nas mãos da tríade da inteligência militar: o CIE (Centro de Informações do Exército), o Cenimar (Centro de Informações da Marinha) e o Cisa (Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica).

Os braços do SNI nos ministérios foram muito atuantes e prejudicaram muito os brasileiros, vários dos quais nem ao menos sabem que foram atingidos. Alguém cogitado para um determinado cargo, se fosse suspeito aos olhos da 'comunidade de informações, certamente não seria nomeado, pois seu chefe teria recebido um 'informe' condenatório."

Extraído da Folha de São Paulo - Rubens Valente

Viver é Perigoso

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