Henrique Meirelles é dotado de grande competência. Foi, durante anos, presidente do Banco Central e escreve aos domingos na Folha. Ontem foi publicado o "paixões perigosas". Interessante.
"Um dos aspectos mais relevantes em qualquer gestão –pública, privada ou
esportiva– é o processo de tomada de decisões. Os graves problemas enfrentados
pela Argentina em consequência de seu calote, os prejuízos e multas bilionárias
pagas por bancos americanos por erros na crise de 2008 e as espetaculares
derrotas da seleção para a Alemanha e a Holanda têm dimensões, implicações e
significados muito diversos. Mas, analisando os processos decisórios, concluímos
que sucessos e desastres são gerados por sequência de decisões com
características comuns.
As decisões bem-sucedidas têm, com frequência, duas características:
1) São tomadas com serenidade e análise rigorosa de dados e baseadas nos
fatos e nas melhores evidências sobre o caminho a seguir.
2) O gestor monitora de perto o resultado das decisões e a evolução do
cenário, sempre pronto para, a qualquer momento, mudar de curso ou revertê-lo se
as medidas gerarem resultados negativos.
Um processo decisório tenderá ao fracasso quando o gestor tomar com
frequência decisões passionais e egocêntricas, priorizando preferências
pessoais, emocionais, ideológicas ou políticas. São fatores que contaminam a
análise e causam perda de foco em relação aos dados da realidade.
Outro gerador de fracasso aparece quando o gestor adota postura de torcedor
emocionado da própria decisão. Vemos isso na gestão de política econômica e de
grandes instituições, que levam a crises nacionais de grande gravidade. O mesmo
ocorre no esporte e em outros campos.
A recusa em reconhecer o fracasso e a necessidade de mudança caracterizam os
processos decisórios baseados em ideias preconcebidas e posições ideológicas,
que se sobrepõem à análise serena e realista dos fatos.
Mas não existem verdades absolutas. As pesquisas trazem muitas vezes
resultados diferentes e estão em revisão constante. Além disso, a realidade é
complexa e mutante. Por isso, as decisões estão sempre sujeitas a erro e devem
ter seus resultados monitorados continuamente, buscando reduzir aspectos
passionais ao menor nível possível.
Cada um pode ser tão passional quanto desejar no seu processo de decisão
somente quando o tomador da decisão arcar com as consequências. Mas é grave
deixar decisões que influenciam grande número de pessoas serem tomadas de forma
emocional, passional ou ideológica."
Henrique Meirelles - Folha
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