Como os jornais da Europa estão entendendo o que acontece no Brasil:
Comentário da BBC sobre artigo publicado no El País.
Por enquanto, o que existe é um consenso de que o Brasil, invejado
internacionalmente até agora, vive uma espécie de esquizofrenia ou paradoxo que
ainda deve ser analisado ou explicado", afirma o artigo, intitulado "Por que o
Brasil e agora?".
O texto, assinado pelo correspondente do jornal no Rio de Janeiro, Juan
Arias, indaga por que agora surge um movimento de protesto quando, ao longo dos
últimos dez anos, o Brasil viveu como que "anestesiado" por seu êxito
compartilhado e aplaudido mundialmente.
"O Brasil está pior do que há dez anos?", pergunta o autor. "Não, está
melhor", responde ele, acrescentando que o país está mais rico, tem menos pobres
e testemunha o crescimento do seu número de milionários. "É mais democrático e
menos desigual", completa Arias.
O autor segue com mais perguntas. "Por que saem às ruas para protestar contra
a alta dos preços dos transportes públicos jovens que normalmente não usam esses
meios porque já têm carros, algo impensável há dez anos?
"Por que protestam estudantes de famílias que até pouco tempo não tinham
sonhado em ver seus filhos pisarem na universidade?"
O texto ainda questiona por que o Brasil, "sempre orgulhoso do futebol, agora
parece estar contra o país sediar o Mundial".
Na avaliação do autor, a resposta para o paradoxo que hoje vive o Brasil
talvez esteja ligada à formação da chamada nova classe média; ao fato de que os
pobres que passaram a ter uma vida melhor estão conscientes de ter dado um salto
qualitativo na esfera do consumo e agora "querem mais".
"Querem, por exemplo, serviços públicos de primeiro mundo; querem uma escola
que, além de acolhê-los, lhes ensine com qualidade, o que não existe; querem uma
universidade que não seja politizada, ideologizada ou burocrática. Querem que
ela seja moderna, viva, que os prepare para o trabalho futuro."
Ainda segundo o texto, os brasileiros, "querem hospitais com dignidade, sem
meses de espera, onde sejam tratados como seres humanos".
"E querem, sobretudo, o que ainda lhes falta politicamente: uma democracia
mais madura, em que a polícia não atue como na ditadura".
"Querem o impossível? Não", afirma o texto, completando que, ao contrário dos
movimentos de 68, "que queriam mudar o mundo", os brasileiros insatisfeitos com
o que já alcançaram querem que os serviços públicos sejam como os do primeiro
mundo.
"Querem um Brasil melhor. Nada mais."
El País e BBC