Prezada Colaboradora doméstica,
Quero cumprimentá-la porque, finalmente,
a sua classe passou a ter os mesmos direitos do restante dos trabalhadores do
nosso país.
Agora as suas horas extras serão remuneradas, você terá
direito ao FGTS, seguro desemprego, intervalo na jornada de trabalho e mais uma
série de benefícios.
Parabéns pela conquista !
Mas, posso informá-la
de que, para mim, pouca coisa mudará...
Afinal estou acostumada ao dia a
dia do mercado de trabalho e, com certeza, saberei me adaptar rapidamente às
novas regras.
Apertando um pouco mais o orçamento, conseguirei pagar
todos os ônus da nova lei, porém me preocupo com o novo tratamento que terei de
dar a você,
pois “para todo bônus, o seu ônus”.
Você será reconhecida
por mim, financeiramente, mas precisará comprovar-me que está apta a ser tratada
como profissional.
Adeus às velhas desculpas de que o ônibus atrasou...
Agora tenho que registrar sua entrada e sua saída, para computar as
horas extras a que você tenha direito...
Não me peça para não
descontar suas faltas!
Inevitavelmente terei que contribuir para um
fundo de garantia por seu tempo de serviço [FGTS] e, por isso, você precisa vir
trabalhar.
Lembre-se, também, que não aceitarei as desculpas de que
você não sabe cozinhar, passar, lavar roupas, pois estas aptidões são
necessárias para
o seu trabalho.
Siga as minhas orientações e cumpra as
minhas determinações.
Para atender às necessidades do meu lar, tal como
acontece nas empresas (veja o comércio), busque a capacitação e a reciclagem,
esteja atenta às
boas relações interpessoais, para que eu possa honrar com
prazer os seus direitos ora adquiridos.
Não vale mais ser doméstica e
estudar datilografia (ah! Isso era antigamente, agora é informática...), ou
passar horas mexendo e aprendendo tudo
do celular ou ouvindo radinho sem se
importar em esmerar-se para atender às necessidades do meu lar, pois isso é o
que o seu emprego requer!... Deixe o lazer para o período de descanso...
Você alcançou uma posição privilegiada, é uma profissional com todos os
direitos da Consolidação das Leis do Trabalho, igual a qualquer empregado
de
uma empresa, embora meu lar e a minha família não se enquadrem nessa categoria e
não tenham fins lucrativos. Portanto, acostume-se a ser advertida, afinal
tarefas não realizadas contarão também para demissão por justa causa.
Prejuízos ocasionados pela má utilização dos pertences de minha
residência [seu local de trabalho], serão tratados como patrimônio, que você
terá
obrigação de zelar e ressarcir-me, caso venha a danificá-lo. E isso
inclui as minhas roupas que você costuma manchar ao lavar e/ou queimar ao
passar. Mas não se preocupe, quando eu fizer a reposição do item por outro
igual, apresentarei o cupom fiscal a você.
Sentirei no bolso, é verdade,
mas a grande privilegiada será você, pois até que enfim alguém pensou em sua
classe, no seu crescimento pessoal e
profissional, espero que com a
aquisição de todos esses benefícios você consiga manter-se no mercado de
trabalho, buscando sempre o aprimoramento profissional.
Espero, ainda, que
esse pouco dinheiro que chegará às suas mãos, uma vez que grande parte dele vai
mesmo ficar para o governo, lhe dê condições
de sustentar a sua família,
pagar os cursos que você precisa fazer e ainda assim ser a amiga e companheira
que nos auxilia ao longo de nossas vidas.
Atentando para tudo isso,
nossa relação de amizade não sofrerá a menor mudança.
Respeito o seu
trabalho, preciso de sua ajuda em meu lar e confio no seu potencial.
Por
isso, espero que essa nova lei seja um marco para nós duas.
Um abraço e
muito sucesso para você!
Sua patroa.
(email recebido pelo Walter Bianchi)
ER