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sábado, 8 de janeiro de 2011

SOBRE POLÍTICA

Trecho de entrevista concedida pelo filósofo e coordenador do Núcleo Direito e Democracia, do Centro Brasileiro de Planejamento e Análise (Cebrap), Marcos Nobre, paulistano de 45 anos, doutor pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doc na Universidade de Frankfurt, Alemanha. (publicada no OESP)

O que é exatamente o peemedebismo?

É uma cultura política que tem como características estar no poder – igualar sobrevivência política com adesão a quem estiver no governo – e não ter consistência ideológica, um discurso completamente anódino, que qualquer um pode subscrever. É um sistema de gerenciamento de interesses no qual, como ninguém formula nada muito precisamente, todo mundo pode entrar. Fazer política dentro do peemedebismo significa receber direito de veto sobre algumas questões: a bancada evangélica pode vetar qualquer coisa que diga respeito à religião; a ruralista, questões relativas à terra; e assim por diante.

Essa cultura do peemedebismo vai além do partido PMDB?

O PMDB é como se fosse a ponta do iceberg do peemedebismo. Este é um fenômeno de longo prazo, que vai além da agremiação partidária. Para mim, por exemplo, Aécio Neves é uma das maiores expressões do peemedebismo. O que ele tem para dizer? Nada. Seu discurso é anódino e ele nunca tem uma posição contra alguma coisa. Por isso é fácil imaginar que se o PSDB não deixá-lo se candidatar à Presidência, Aécio vai procurar outra opção partidária.

Como se explica a permanência de Sarney na presidência do Senado, apesar dos protestos da sociedade e da imprensa?

Sarney é o símbolo do peemedebismo: tem doutorado, livre-docência e titularidade sobre seu funcionamento. E esse predomínio do peemedebismo pode levar a um fechamento do sistema político para a sociedade. Veja a sucessão de crises e seus efeitos cada vez menores: primeiro Collor é derrubado por impeachment, depois ACM e Jader Barbalho são obrigados a renunciar, então Renan Calheiros deixa a presidência do Senado, mas não renuncia e, por fim, Sarney nem sai da presidência nem renuncia. A gente pode gritar quanto quiser porque o sistema está começando a se fechar em si mesmo, está em divórcio muito grave com a sociedade. O que esse sistema político diz? “Enquanto estivermos nesta bonança econômica podemos dar uma banana para a relação com a sociedade.” Agora, uma coisa é fazer isso com um líder popular como Lula mediando as demandas. Outra é com Dilma.

O peemedebismo pode ser superado?

Não por acaso, Lula saiu do poder dizendo que sua prioridade é juntar lideranças para propor a reforma política. O ex-presidente não é a pessoa mais indicada para encaminhá-la, mas ela é necessária. Temos de produzir um sistema político que permita a polarização, no qual quem governa não seja engolido pela peemedebização. Para isso, não há receita, mas é preciso que o debate – da cláusula de barreira ao financiamento de campanha, por exemplo – seja pautado por esse objetivo. Senão, vamos continuar em uma democracia que patina, discute assuntos tópicos de maneira acalorada, mas não avança em reforma alguma nem desenvolve sua cultura democrática.

OESP

2 comentários:

© Sara Marques disse...

Edson, parabéns pelo Blog!
Tenho lido sempre as suas postagens.
Gostei muito "das dicas" de livros que vc leu recentemente.Ótimas sugestões de leitura!
Obrigada por compartilhar!

Edson Riera disse...

Sara,

A casa é nossa.

Grato,

edson